terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

A importância de apresentar a UJS para milhares de jovens

Um período muito importante na consolidação da minha militância e da passagem à direção da UJS foi o que se se iniciou com a estabilização das reuniões da UJS na Rua 24 de Maio, no Centro de Fortaleza, sede do Sindicato dos Bancários. Era um lugar público e amplo, de fácil localização, neutro, muito bom para fazer as reuniões. Na frente, a gente se encontrava e ficava trocando idéias, esperando chegar todo mundo e começar a reunião.
Por alguns anos aquele endereço foi o nosso ponto de encontro aos sábados, às três da tarde. Você queria encontrar a UJS, era só chegar lá e estávamos reunidos. Com esta estabilidade de local de reunião, a chegada de muita gente nova (era o pós Fora Collor), fomos construindo uma nova geração de dirigentes.

Nesta época, primeira metade dos anos 90, em Fortaleza, a UJS era ainda exclusivamente secundarista. E era muito interessante quando chegava aquela moçada de diferentes escolas e bairros em que tínhamos alcançado. Eles e elas representavam estes lugares. Era assim que eu via aquele sorriso no rosto do Francisco, liderança imbatível do Valter Sá Cavalcante, uma escola bem distante, na Cidade dos Funcionários. E Valter Sá fora uma liderança estudantil de peso, ex-vice presidente da UNE.

Este sentimento de liderança tinha a ver com uma certeza que tínhamos. Sabíamos que éramos capazes de mobilizar centenas de outros jovens e parar o Centro de Fortaleza e já o fizéramos. Esta identidade moblizadora, de luta, é uma característica muito importante na UJS

A sociabilidade da juventude que ingressa na UJS

Naqueles momentos construíamos laços de amizade e convivência, aquela moçada visitava as escolas e a UJS se organizava meio que em zonais, formal ou informalmente. As lideranças tinham uma vida vinculada aos bairros onde estavam suas escolas, inclusive no Centro, onde haviam várias. Meu irmão, Roberto, por exemplo, organizando a UJS na Barra do Ceará, quando estudava no Hilza Diogo. De sua ação surgiram várias novas lideranças, muitas delas vindas de famílias pobres. E daí surgiram alguns diretores da UBES.

É muito comum, num determinado Bairro, como era o caso da Barra do Ceará, ter várias escolas próximas, potencial incrível de mobilização estudantil. Em torno de uma escola - onde havia mais filiados - se encontravam estudantes de quatro escolas ou mais. A ampla maioria dos jovens com quem nos relacionávamos, aquelas centenas que iam às mobilizações, a maioria não era da UJS e haviam diferentes níveis de apoio que determinavam a nossa liderança naquelas escolas. Cada escola tinha a sua dinâmica, a sua política interna, os seus personagens. A liderança era exatamente o conhecimento desta dinâmica, o diálogo com ela.

Deste modo, era um movimento amplo, pois se dirigia aos estudantes e também à comunidade singular que chamamos escola, mas que pode também ser um curso, ou mesmo uma faculdade. Nesta realidade atuávamos num universo político e humano muito rico.

É desse período que me recordo das ladainhas, modo tipicamente cearense de chamar o primeiro ponto das reuniões de sábado, com cerca de vinte pessoas. Digamos que umas cinco pessoas que chegavam não eram ainda formalmente da UJS, vinham trazidas por outro militante. A ladainha era o nosso ponto de conjuntura de então, a recepção às pessoas novas que chegavam, as boas vindas.

Minha opinião é que a UJS tem mais consolidada a sua direção na medida em que conseguir estabelecer um funcionamento próprio, que crie um ambiente de convivência entre jovens de diversos lugares que se reconhece na ação e no encontro. É quando estamos juntos que a UJS fica mais bonita.

Era um compromisso, mas era legal ir, nesse jeito de ser da UJS. E eu sentia falta de rever as pessoas. Naquelas reuniões eu aprendi que é decisivo haver uma galera que chame a si a responsabilidade de lutar pelos direitos da juventude, que tenha raiva de injustiças, que é patriota e animada, adora curtir, adora viver sua juventude.

Isto deve se expressar na convivência que construímos entre nós. Fazer tanta coisa nos coloca muito próximos, convivendo por horas, dias, meses, anos. Eu tenho amigos de quinze anos que fiz na UJS.

E esta relação entre tantos jovens se faz com mais qualidade se temos lugares fixos, com dia e hora dedicado ao reencontro da nossa moçada. Eu lembro que estes sábados à tarde eram parte constante da minha agenda. Reunir no sindicato dos Bancários todo sábado às três da tarde foi fundamental para consolidar aquela moçada na UJS.


Nós tivemos que formatar um funcionamento próprio, um circuito político formado por onde circulávamos e fazíamos o movimento, mas também por bares, festas, bairros, salas de aula, pátios de escolas, este foi o ambiente da minha juventude. Ambiente onde desenvolvemos práticas, um aprendizado coletivo.

Mais à frente, quando retomamos a direção do DCE da UFC – depois de um intervalo de mais de dez anos – entendi melhor que aquele resultado foi o cume de um aprendizado cuja sala de aula mais importante fora naquelas reuniões, onde pudemos pensar a UJS por inúmeras tardes.

Lá foi que inventamos a “ladainha”.apelido de um momento das reuniões. Esta mofa, esta ironia, “perder o amigo mas não perder a piada”, é tipicamente cearense. Chamávamos com esse tom humorístico e crítico de ladainha a repetição do que nós somos, da História e do presente da UJS. Naquela hora, iniciando a reunião, um membro da direção tomava a palavra e apresentava aos mais novos ante o olhar dos militantes a História da UJS. Lembro de quando o Flávio Arruda fazia as ladainhas até hoje. Era um aprendizado de falar ao público, de defender nossas idéias, de afirmar valores. Para quem chega, por outro lado, era uma sensação muito boa, uma valorização da importância daquela pessoa que estava sendo convidada a ingressar na UJS. Para quem falava era um comprometimento e um exercício do domínio de nossa política, o que descobri quando passei a fazê-lo, junto com a Andréia Oliveira, a Viviane Rodrigues e o próprio Roberto.

E era repetitivo mesmo, e cumpria um grande papel. O Legião Urbana consagrou uma frase: “Sei que às vezes uso palavras repetidas, mas quais são as palavras que nunca são ditas?”. Apóio-me nessa frase quando defendo a importância da massificação de nossos conceitos mais simples, das nossas opiniões mais permanentes, como o Manifesto da UJS, nossa concepção de Movimento Estudantil, nossa História, inclusive nos Estados. Claro que é muito importante saber muito, e eu, um leitor compulsivo não o posso negar. Mas é decisivo que todos saibam quem somos, como pensamos, pelo que lutamos. E passar este conhecimento no debate do Congresso da UJS, na discussão da tese permite que outros milhares de jovens ajudem a escrever a história de nossa organização.

Penso que boa parte da consolidação de uma direção municipal, de um núcleo, e mesmo de uma direção estadual estão nisso, em definirmos com o apoio de todos uma agenda, um funcionamento, criarmos uma dinâmica própria, que permita debater as polêmicas, construir os consensos, passar aos mais novos como devemos proceder na relação com outros jovens, preparar um ambiente legal para centenas de jovens viverem sua opção militante.

Um ambiente aberto para o ingresso de mais jovens do povo, capaz de atrair as lideranças naturais que existem entre os jovens e lhes dar um espaço de convivência divertido, produtivo, ordenado por nós mesmos, capaz de potencializar suas melhores qualidades e sua liderança. E um ambiente politizado, em que cada jovem entenda que está em um lugar muito maior que apenas um grupo de amigos.

Um grupo de jovens que muda a realidade com seu protagonismo, uma galera rebelde, tão rebelde que são socialistas e defendem um socialismo com a cara do Brasil e da Juventude, com samba, maracatu, com boi, hip hop e reizado.

Em muitos estados a UJS prepara as suas plenárias para lançar o 14º. Congresso. A partir delas, haverá o acionar de uma grande estruturação que consolidará núcleos e direções que se dirigirão a vários milhares de jovens convidando-os para conhecer a UJS. Será um semestre em que muitos jovens sentirão o chamado a uma militância mais ativa, maiores responsabilidades.

Acredito que este riquíssimo momento merece que as direções tracem táticas e formas de falar com esta juventude, a partir dos que já são filiados, mas buscando dialogar com amplas parcelas da juventude, muita gente independente nas escolas, no trabalho, nas universidades, na periferia e também em movimentos juvenis, jovens que já entendem a importância das causas, de ser voluntário, muitos sem entender ainda que a militância, este voluntariado político, muda a realidade. Para que entendam isto, precisam ter a oportunidade de nos ouvir, e a responsabilidade de pensar estes momentos, de criar estas oportunidades, esta responsabilidade é nossa.

Envolver, convidar e saber se apresentar é fundamental para que amplas parcelas da juventude possa sentir-se parte da mudança do Brasil. Para isto é necessário ter uma pedagogia própria. Não somos uma igreja, nem uma empresa, somos algo muito diferente e devemos entender que nossos fóruns, reuniões, plenárias devem ser construídos conscientemente, devem ter um roteiro claro para que as pessoas nos entendam e se sintam chamadas a participar, convidadas a dar sua contribuição voluntária e consciente à mudança.
O desafio teórico e prático de se dirigir à juventude e a construção do 14o. Congresso.

Vários estados preparam cursos voltados às principais lideranças, cursos que ajudarão àqueles que ocuparão lacunas nos postos de direção a entenderem melhor como se tornarem lideranças. É um passo muito importante. Mais importante que este passo é, no entanto, na minha visão, elaborar ao nível dos estados e municípios, com destaque para os principais núcleos, espaços em que nos dirijamos a mais jovens de maneira compreensível, legal, segundo cada contexto, multiplicando por muitos milhares os jovens que conhecem a UJS. E como já opinei nesta coluna, Filiado é pra se guardar do esquerdo do peito, e já há um grande público para quem temos a obrigação de falar, os que já são filiados, os amigos que a UJS fez nas passeatas do Fora Bush, nos Congressos da UNE e da UBES, nos encontros de jovens trabalhadores e no processo da Conferência de Juventude.

Por isto estamos elaborando o curso de Nível 1 da UJS. Será no formato de uma reunião preparada para dar boas vindas, para apresentar a UJS. De uma proposta elaborada centralmente poderão se preparar inúmeros modelos, adaptações criativas que permitam que se dê a mesma mensagem de diversas formas, a expressão juvenil concreta à mais juvenil das mensagens, a que apresenta o socialismo à juventude e a juventude ao socialismo. Que cada voz dê o tom à mensagem e que possamos levá-la a todos. Que seja bem dito com a emoção da convicção e com a clareza do método e da empatia. E que dos muitos milhares que nos escutem surja a compreensão de que precisamos de mais jovens para defender as causas justas, para tomar parte na História do Brasil.

*Paulo Vinícius, Cientista social e diretor de formação da UJS.

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